Nuno Henrique – A Morte escreve a Floresta

26/Set/2025
a 25/Jan/2026

Alguns dos temas recorrentes no meu trabalho encontram na obra de Alberto Carneiro um exemplo maior – a árvore; a floresta. Uma das primeiras exposições de que tenho memória é precisamente a Exposição antológica 1968-2003 de Alberto Carneiro apresentada no Museu de Arte Contemporânea do Funchal, em 2003. O sentido de uma arte ecológica, tal como expressa por Carneiro nos seus textos e obras, tem uma especial ressonância com as minhas preocupações estéticas desde o início do meu percurso. O reencontro com a sua obra surge assim como o ponto de partida para o projeto expositivo que agora apresento no CAAC. Em concreto, um conjunto de serigrafias de Alberto Carneiro que apresentam registos fotográficos a preto e branco de uma floresta, onde se sobrepõem manchas e feixes de cor que remetem para o espectro das cores visíveis. As árvores, a floresta e a cor forneceram as pistas para a construção da constelação de peças composta por uma instalação escultórica, um conjunto de desenhos/frottages de troncos de árvores e um livro de artista.

As peças escultóricas reproduzem a forma alongada da concha de um caracol, a Wollastonaria turricula, espécie endémica de um pequeno ilhéu do arquipélago do Porto Santo. Este ilhéu, nomeado no séc. XVI de Ilheo dos Dragoeiros, pela abundância da árvore com o mesmo nome, atravessa atualmente um processo de recuperação do seu habitat. Com a colonização do arquipélago, os dragoeiros desapareceram há muito do ilhéu, e os que foram reintroduzidos não têm condições para se desenvolver. No entanto, o minúsculo molusco, que há poucos anos estava restrito a uma área de 50m2 do ilhéu, tem conseguido multiplicar-se e expandir a sua distribuição.

Gosto de pensar neste caracol como uma semente ou embrião de dragoeiro. Em conjunto com outras espécies (incluindo a humana), está lentamente a preparar as condições para que um bosque de dragoeiros possa ali voltar a crescer. Das conchas/esculturas saem também feixes de cor, na forma de arco-íris, mas com as cores do dragoeiro – das flores; dos frutos; das folhas; da seiva; do tronco – parafraseando as Notas para um Manifesto de uma arte ecológica de Alberto Carneiro: tomar a árvore e transformá-la em (obra de arte).

Nuno Henrique 2025


Nuno Henrique vive e trabalha entre Nova Iorque, Lisboa e Madeira. É mestre em Belas-Artes pela Pratt Institute, Nova Iorque, 2016, e licenciado em Escultura pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto, 2005. Em 2008, foi assistente de produção na Porta 33. Frequentou o Projeto Individual na Ar.Co, em Lisboa, durante os anos académicos de 2009/2010. Expõe regularmente desde 2009. Em 2024, apresentou a exposição individual “O Cão do Dragoal” no Museu Henrique e Francisco Franco e publicou o livro de artista “O Cão do Dragoal/Double Rainbow”, Funchal. Participou na exposição coletiva “A Moeda Viva”, com curadoria de Maria do Mar Fazenda, na Galeria Quadrum, Lisboa. Em 2023, foi selecionado para o “13.º Prémio Amadeo Souza Cardoso”, em Amarante, e apresentou o projeto individual “A altitude de um caracol” na Galeria Mupi, Porto. Foi distinguido com bolsas de várias instituições, incluindo: Ar.Co/Porta 33, 2009/10; Centro Nacional de Cultura, 2011; Fundacíon Botín, Santander, 2012; Fundação Calouste Gulbenkian/FLAD 2012 e 2014–2016. A sua obra está representada em várias coleções, como: Ar.Co, Biblioteca do Vaticano, Câmara Municipal de Lisboa, Biblioteca de Arte da Gulbenkian, Fundação Carmona e Costa, Fundação Centenera Jaraba, Fundação EDP, Coleção Fernando Figueiredo Ribeiro, Coleção MG, MUDAS. Museu de Arte Contemporânea.

Inauguração da exposição